RESUMO
Atualmente, há uma discussão sobre a busca pessoal realizada por policiais militares durante as abordagens policiais. Antes de entrar nessa discussão, o artigo analisa a busca pessoal processual considerando as disposições do Código de Processo Penal, da Jurisprudência e da Doutrina, levando-se em consideração, ainda, a perspectiva do garantismo constitucional e o princípio da proporcionalidade. Em seguida, faz-se uma diferenciação entre a busca pessoal processual (meio de obtenção de prova) da busca pessoal administrativa (ou preventiva), este último como corolário do Poder de Polícia da Administração Pública, expondo os elementos que caracterizam uma e outra. Robustecendo a investigação, procurou-se apontar as problemáticas advindas do “transplante jurídico” de elementos do Direito Norte-Americano sem considerar as características do sistema receptor (ordenamento brasileiro). Por fim, completando a investigação, procurou-se verificar os pressupostos e os limites da busca domiciliar.
INTRODUÇÃO
Atualmente, um campo de estudo de que provoca bastante debates no Processo Penal é aquele atinente as buscas pessoal e domiciliar. Nesse sentido, o presente trabalho pretende explorar a natureza jurídica dessas buscas, as hipóteses de sua aplicação, as possíveis causas de ilegalidade ou nulidade, considerando, também, a doutrina e a jurisprudência e as disposições da própria Lei.
Para emprestar robustez à pesquisa, sobretudo no que diz respeito a busca pessoal processual, analisar-se-á a referida medida frente ao princípio da proporcionalidade e do paradigma garantista.
Também, busca-se estabelecer uma diferenciação entre a busca pessoal prevista no Código de Processo Penal daquela busca pessoal realizada pelas polícias militares quando de suas atividades de fiscalização, a qual a doutrina chama de “busca pessoal preventiva”, contudo, como explicaremos, preferimos a expressão “busca pessoal administrativa”.
Para isso, consolidar essa diferenciação, procurar-se-á a verificar possíveis lacunas legais e qual o entendimento dos tribunais superiores quanto a essa temática, utilizando-se, ainda, de elementos advindos da doutrina, sobretudo daquela parcela da doutrina que se dedica ao estudo da segurança pública, dada a relação umbilical entre o tema da segurança pública e da busca pessoal.
Por fim, apontou-se os pressupostos e limites da busca domiciliar, considerando os conceitos jurídicos de domicilio e de dia, os quais são objeto de constante debate doutrinário.
2. DA BUSCA PESSOAL PROCESSUAL
A definição de busca pessoal não vem veiculada pelo Código, o que gera alguns problemas. Referido instituto está previsto no Código de Processo Penal (CPP) no Título VII, da Prova, o que abre caminho para se verificar se tal busca seria uma prova ou outro elemento. Por isso, são importantes as considerações de Renato Brasileiro:
A expressão fonte de prova é utilizada para designar pessoas ou coisas das quais se consegue a prova, dai resultando a classificação em fontes pessoais (ofendido, peritos, acusado, testemunhas) e fontes reais (documentos, em sentido amplo). […].
Por sua vez, meios de prova são os instrumentos através dos quais as fontes de prova são introduzidas no processo. […].
Por fim, os meios de investigação da prova (ou de obtenção da prova) referem-se a certos procedimentos (em regra, extraprocessuais) regulados por lei, com o objetivo de conseguir provas materiais, e que podem ser realizados por outros funcionários que não o juiz. [grifos nossos].
Ora, mas e quanto ao elemento de prova e ao indício? Pois bem, Indício “É um fato ligado ao crime que indica e aponta o possível autor. Um sinal demonstrativo do crime e da autoria.”3, ao passo que elemento de prova, “[…] são todos os dados objetivos que confirmam ou negam uma asserção a respeito de um fato que interessa à decisão da causa.”4
O Código de Processo Penal (CPP), quando regulou a busca pessoal, limitou se a afirmar que “Proceder-se-á à busca pessoal quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma proibida ou objetos mencionados nas letras b a f e letra h do parágrafo anterior.” (art. 240, §2º), especificando que “A busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar” (art. 244), mas nada definiu sobre o conceito em si, restando à doutrina e jurisprudência a definição de sua natureza jurídica.
Filiamo-nos a concepção de que a busca pessoal é um meio de obtenção de prova e não uma prova, um indício, uma fonte de prova ou meio de prova. Isso porque sua finalidade é a obtenção de prova de materialidade (em realidade, de elementos de cognição que demonstrem a materialidade, já que prova só existirá depois do efetivo contraditório). Nesse sentido, a busca pessoal não pode ser prova porquanto não há prova sem a sua submissão ao contraditório e também não pode ser elemento de cognição, já que o elemento de cognição é um elemento ligado ao fato, ao passo que a busca pessoal é um procedimento. Pela mesma razão, inviável de se conceber a busca pessoal como um indício.
²LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo penal: volume único. 9. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2021. Págs. 560 e 561
³ARANHA, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006, p.331
⁴LIMA, Op. cit., p. 559
Também não pode ser fonte de prova, já que fonte de prova é de onde se extrai a prova, sendo seu instrumento o meio de obtenção de prova, que agirá sobre a fonte de prova.
Igualmente, não pode ser meio de prova, porquanto a busca pessoal não chega a ser materializada dentro do processo, isto é, não é possível “embutir” dentro do processo uma busca pessoal, mas apenas e tão somente os elementos de prova e os indícios adquiridos com tal técnica, isto é, adquiridos da fonte de prova.
Por isso, a busca pessoal é meio de obtenção de prova, já que se trata de uma técnica, um método para obtenção de elementos de prova ou de indícios, que são retirados das fontes de prova (que, por sua vez, podem ser documentos, testemunhas, instrumentos, etc.).
Ainda sobre a busca pessoal processual, o Código estabelece que ela realizada com ou sem mandado judicial, e pode ocorrer para: apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos, instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos, armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso, objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu, cartas, abertas ou não (destinadas ao acusado ou em seu poder quando haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à elucidação do fato), para apreender vítimas de crimes ou, ainda, colher qualquer elemento de convicção.
Essa medida independerá de mandado quando for o caso de prisão ou quando houver fundada suspeita5 de que porte arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito. Também independerá de mandado quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar, é dizer, ainda que não conste do Mandado Judicial.
Ora, mas e se a busca domiciliar se der nas hipóteses excetuadas pela Constituição, é dizer, em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, poderia se proceder em uma busca pessoal, independentemente de mandado? Nesse caso, não há dúvidas que em caso de prisão, sim, porquanto a própria Lei faz essa anotação.
No entanto, deve-se tomar o cuidado para não transformar a referida medida naquilo que a doutrina norte-americana chama de Fishing Expedition, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS, PORTE DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO E RESISTÊNCIA. FLAGRANTE. DOMICÍLIO COMO EXPRESSÃO DO DIREITO À INTIMIDADE. ASILO INVIOLÁVEL. EXCEÇÕES CONSTITUCIONAIS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. DESVIO DE FINALIDADE E FISHING EXPEDITION. NULIDADE PARCIAL DAS PROVAS OBTIDAS. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
[…].
4. É ilícita a prova colhida em caso de desvio de finalidade após o ingresso em domicílio, seja no cumprimento de mandado de prisão ou de busca e apreensão expedido pelo Poder Judiciário, seja na hipótese de ingresso sem prévia autorização judicial, como ocorre em situação de flagrante delito. O
agente responsável pela diligência deve sempre se ater aos limites do escopo – vinculado à justa causa – para o qual excepcionalmente se restringiu o direito fundamental à intimidade, ressalvada a possibilidade de encontro fortuito de provas.
5. Admitir a entrada na residência especificamente para efetuar uma prisão não significa conceder um salvo-conduto para que todo o seu interior seja vasculhado indistintamente, em verdadeira pescaria probatória (fishing expedition), sob pena de nulidade das provas colhidas por desvio de finalidade.
6. No caso dos autos, o ingresso no domicílio do acusado foi justificado com base na alegação dos policiais de que, em patrulhamento de rotina, avistaram o réu com um volume na cintura que aparentava ser uma arma de fogo, razão pela qual decidiram abordá-lo, mas ele demonstrou nervosismo e se evadiu da guarnição para o interior da residência. Perseguido e capturado o réu, constatou-se que, de fato, ele portava uma arma de fogo municiada na cintura. Depois disso, os policiais soltaram cães farejadores na residência do recorrente e passaram a fazer uma varredura minuciosa à procura de drogas,
oportunidade em que encontraram, dentro de uma mochila em um guarda
roupas, 518 gramas de cocaína e uma balança de precisão; ainda, no fundo
falso de uma gaveta apreenderam mais R$ 7.000,00 em dinheiro e uma caderneta com anotações do tráfico.
7. Ao menos para perseguir e capturar o recorrente no interior do imóvel, havia justa causa amparando a ação dos agentes de segurança. Com efeito, segundo assentaram as instâncias de origem, além de o réu haver demonstrado nervosismo ao avistar a guarnição policial e haver fugido dos agentes, eles afirmaram que viram um volume na cintura do acusado que aparentava ser uma arma de fogo (o que se confirmou ao final), de modo que tinham fundadas razões para acreditar estar configurada situação de flagrante delito para ingressar no domicílio em perseguição ao réu a fim de apreender a arma. Isso, todavia, não significa que, uma vez concluído o propósito que legitimou excepcionalmente o ingresso domiciliar, estivessem os militares autorizados a fazer uma varredura na residência do acusado, com o auxílio de cães farejadores, à procura de drogas, porquanto já havia sido cumprida a finalidade da diligência invasiva.
8. Na espécie, fica evidente o desvio quanto à finalidade que ensejou o
ingresso no domicílio do réu, porquanto a justa causa se relacionava
exclusivamente ao porte de uma arma de fogo, a qual já havia sido
apreendida – junto com o carregador e as munições – tão logo o recorrente foi capturado e revistado. Ao soltar os cães farejadores na residência e vasculhar
seu interior minuciosamente, com o deliberado intento de procurar drogas
(não se tratou, portanto, de encontro fortuito), os policiais ultrapassaram
nitidamente o escopo da medida invasiva e, por isso, macularam a validade
das provas colhidas a partir do momento em que foram apreendidos a arma,
o carregador e as munições no corpo do réu.
9. Recurso parcialmente provido para o fim de reconhecer a ilicitude das provas colhidas no interior da residência do acusado, ressalvada, apenas, a
apreensão da arma de fogo, do carregador e das munições, os quais foram
localizados junto ao corpo do recorrente em revista pessoal dentro do
domicílio.
(RHC n. 165.982/PR, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma,
julgado em 20/9/2022, DJe de 26/9/2022.). […]
Sobre o mérito deste julgado, faremos uma análise nas próximas seções. No entanto, é importante consignar que aquelas provas que são obtidas em desconformidade com a Lei devem ser desentranhadas dos autos, porquanto são ilícitas, sendo inadmissíveis no processo por expresso mandamento constitucional (art. 5º, inc. LVI).
Como dissemos, a Busca Pessoal não vem definida no Código, o que pode gerar confusão nos operadores do Direito e, por isso, é necessário diferenciar a busca pessoal prevista no Código de Processo Penal da Busca Pessoal derivada do Poder de Polícia da Administração Pública, que faremos na próxima seção primária.
2.1 BUSCA PESSOAL, GARANTISMO E O PRINCIPIO DA PROPORCIONALIDADE
Ensina Noberto Bobbio que “as normas jurídicas não existem isoladamente, mas sempre em um contexto de normas que guardam relações particulares entre si […]. Esse contexto de normas costuma ser chamado de ‘ordenamento’”7. Tal contexto de normas se organizam sistematicamente, de forma que
[…] diz-se que um ordenamento jurídico constitui um sistema porque nesse não podem coexistir normas incompatíveis. “Sistema aqui equivale a validade do principio que exclui a incompatibilidade das normas. Se num ordenamento surgirem normas incompatíveis, uma delas ou ambas devem ser eliminadas. Se isso é verdade, quer dizer que as normas de um ordenamento têm uma certa relação entre si, e essa relação é a relação de compatibilidade, que implica a exclusão de incompatibilidade.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (Sexta Turma). Recurso Ordinário em Habeas Corpus Nº 165982/PR. Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, 20 de set. de 2022. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/. Acesso em: 17 de dezembro de 2022.
7 BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. Tradução de Ari Marcelo Sólon. 2. Ed. São Paulo: EDIPRO, 2014.p.37
Evidentemente que a “exclusão” de determinada norma deve ser feito em relação a determinado caso concreto, sobretudo no campo dos direitos e garantias fundamentais, os quais podem entrar em conflito, de forma que não se pode analisar um instituto jurídico de forma a apenas considerar uma fração do ordenamento, é dizer, há toda uma gama principiológica e de normas constitucionais e legais que devem ser integralmente consideradas.
Considerando o ordenamento de maneira integral surgem as aparentes antinomias e os conflitos entre direitos fundamentais, os quais serão, necessariamente, sanados – dada a característica sistêmica do ordenamento. No entanto, o conflito entre direitos fundamentais não se resolve da mesma forma que são resolvidas as antinomias legais ordinárias. Sobre essa resolução, Mendes e Gonet Branco explicam o seguinte:
A Corte Constitucional alemã reconheceu, expressamente, que, “tendo em vista a unidade da Constituição e a defesa da ordem global de valores por ela pretendida, a colisão entre direitos individuais de terceiros e outros valores jurídicos de hierarquia constitucional pode legitimar, em casos excepcionais, a imposição de limitações a direitos individuais não submetidos explicitamente a restrição legal expressa”.
Ressalte-se, porém, que o Tribunal não se limita a proceder a uma simplificada ponderação entre princípios conflitantes, atribuindo precedência ao de maior hierarquia ou significado. Até porque, como observado, dificilmente se logra estabelecer uma hierarquia precisa entre os diversos direitos fundamentais constitucionalmente contemplados682. Ao revés, no juízo de ponderação indispensável entre os valores em conflito, contempla a Corte as circunstâncias peculiares de cada caso. Daí afirmar–se, correntemente, que a solução desses conflitos há de se fazer mediante a utilização do recurso à concordância prática (praktische Konkordanz), de modo que cada um dos valores jurídicos em conflito ganhe realidade.
Uma tentativa de sistematização da jurisprudência mostra que ela se orienta pelo estabelecimento de uma “ponderação de bens tendo em vista o caso concreto” (Guterabwägung im konkreten Fall), isto é, de uma ponderação que leve em conta todas as circunstâncias do caso em apreço (Abwägung aller Umstände des Einzelfalles), estabelecendo-se uma prevalência condicionada.
Para Alexy, a ponderação realiza-se em três planos. No primeiro, há de se definir a intensidade da intervenção. No segundo, trata-se de saber a importância dos fundamentos justificadores da intervenção. No terceiro plano, então se realiza a ponderação em sentido específico e estrito. Alexy enfatiza que o postulado da proporcionalidade em sentido estrito pode ser formulado como uma “lei de ponderação” segundo a qual, “quanto mais intensa se revelar a intervenção em um dado direito fundamental, mais significativos ou relevantes hão de ser os fundamentos justificadores dessa intervenção”
Esse ideal de proporcionalidade, de ponderação, em muito se assemelha ao garantismo – mas com ele não se confunde. O Estado Brasileiro possui uma Constituição garantista, no sentido de que deve-se observar, além das normas de proteção ao investigado, também as normas de proteção à Sociedade.
Como se sabe, o garantismo é um modelo do estado de direito, sujeito à uma Constituição e, sendo o atual paradigma constitucional o neoconstitucionalismo, o garantismo se manifesta com a busca pelo cumprimento integral dos postulados de uma Constituição calcada nos ideais do neocontitucionalismo, isto é, com o cumprimento da Constituição de um estado social e democrático de direito.
Ocorre que, a doutrina garantista é exposta, não raras vezes, de maneira muito equivocada, no sentido de proteção exclusiva dos direitos fundamentais dos investigados, o que gera a insatisfação de boa parcela da sociedade frente à crescente criminalidade. É nesse sentido que o professor Douglas Fischer criou as expressões “garantismo penal monocular e hiperbólico” versus “garantismo penal integral”. De acordo com o professor:
[…]. Em muitas situações, ainda há (pelo menos alguma) distorção dos reais pilares fundantes da doutrina de Luigi Ferrajoli (quiça pela compreensão não integral dos seus postulados). Daí que falamos, em nossa crítica, que se tem difundido um garantismo penal unicamente monocular e hiperbólico: evidencia-se: desproporcionalmente e de forma isolada (monocular) a necessidade de proteção apenas dos direitos fundamentais individuais dos cidadãos que se vêem investigados, processados ou condenados. Jamais propusemos ou proporemos a desconsideração dos direitos fundamentais individuais previstos na Constituição. Não é disso que se trata. Quer-se, unicamente, uma visão sistêmica do Direito, para além de visualizar exclusivamente direitos individuais.
[…].
Em nossa compreensão (integral) dos postulados garantistas, o Estado deve levar em conta que, na aplicação dos direitos fundamentais (individuais e sociais), há necessidade de garantir também ao cidadão a eficiência e segurança.
Nesse momento do silogismo, é digno de nota que, também como imperativo constitucional (art. 144, caput, CF), o dever de garantir segurança (que se desdobra em direitos subjetivos individuais e coletivos) não está em apenas evitar condutas criminosas que atinjam direitos fundamentais de terceiros, mas também na devida apuração (com respeito aos direitos dos investigados ou processados) do ato ilícito e, em sendo o caso, da punição do responsável.
Sendo o garantismo uma doutrina de integral proteção dos direitos fundamentais de todos os seres humanos, inclusive os das vítimas, pode-se dizer que o garantismo possui duas manifestações inseparáveis, uma positiva e outra negativa.
O chamado garantismo positivo é aquele que implica em uma ação do Estado, uma manifestação ativa, v.g. a adoção de medidas cautelares, ao passo que o garantismo negativo é aquele que impõe um dever de abstenção por parte do Estado, devendo o estado respeitar os direitos e garantias individuais fundamentais, v.g. o nemo tenetur se detegere e a regra ser responder ao processo em liberdade.
Em razão desse duplo perfil, o garantismo – como já mencionado – tem uma grande semelhança com a dupla face do princípio da proporcionalidade (untermassverbot – proibição de proteção deficiente – e ubermassverbot – proibição do excesso), malgrado tal princípio não tenha sido utilizado pelo Professor Luigi Ferrajoli –o mais importante expoente da tese garantista.
Nessa toada, considerando a Constituição Brasileira como uma Constituição garantista, sendo a segurança pública um direito fundamental de toda pessoa, consoante disposição expressa na Constituição Federal (CRFB), direito este que, inclusive, é essencial para a garantia de outros direitos, como o da vida, da liberdade, o da propriedade, o do transporte, o do trabalho, o da saúde, dentre outros e sendo a busca pessoal processual um instrumento importante da administração pública para a consecução de seus fins, torna-se inviável a anulação massiva de processos sob o argumento de que representaria violação à presunção de inocência (art. 5º, inc. LVII da CRFB) e à intimidade do indivíduo (art. 5º, inc. X da CRFB), porque o caso se trata de busca de equilíbrio entre direitos fundamentais.
3. DA BUSCA PESSOAL ADMINISTRATIVA
Como mencionado alhures, a busca pessoal do CPP não se confunde com àquelas atividades de parada e revista realizada pelos policiais (os chamados popularmente de “enquadros”).
Nesse sentido, alguns doutrinadores estão marcando a diferenciação chamando aquelas abordagens e revistas realizadas pela Polícia, no exercício de Poder de Polícia, como “busca pessoal preventiva”. A “busca pessoal” que ocorre quando um policial aborda um transeunte é corolário do Poder de Polícia da Administração Pública, não um meio de obtenção de prova advindo do Código de Processo Penal. É, a busca pessoal preventiva, um ato administrativo e, assim sendo, preferimos a expressão “busca pessoal administrativa”.
Sobre tais abordagens, são importantes as considerações de Ronaldo Roth:
[…] quando é a Polícia preventiva que faz uma abordagem policial a uma pessoa ou uma busca pessoal, para preservação da ordem pública, agindo a fim de inibir a infração penal, esse procedimento, que é discricionário, é disciplinado pelo Direito Administrativo, e realizado com fundamento no poder de polícia. Por outro lado, quando após a infração penal, a Polícia judiciária atua, essa o faz diante da disciplina do Direito Processual Penal, de modo vinculado, e diante das prescrições e formalidades legais, como por exemplo uma busca domiciliar […].
Essa ideia vai ao encontro daquilo que explica a Professora Maria Sylvia, no que diz respeito a atividade desempenhada pelo Estado quando do exercício do Poder de Polícia, segundo a qual um dos meios de atuação desse poder são
[…] os atos administrativos e operações materiais de aplicação da lei ao caso concreto, compreendendo medidas preventivas (fiscalização, vistoria, ordem, notificação, autorização, licença), com o objetivo de adequar o comportamento individual à lei, e medidas repressivas (dissolução de reunião, interdição de atividade, apreensão de mercadorias deterioradas, internação de pessoa com doença contagiosa), com a finalidade de coagir o infrator a cumprir a lei.
Assevera a autora que o poder de polícia pode ser discricionário ou vinculado, sendo discricionário quando “a lei deixa certa margem de liberdade de apreciação quanto a determinados elementos, como o motivo ou o objeto […]”, e vinculado quando “a lei já estabelece que, diante de determinados requisitos, a Administração terá que adotar solução previamente estabelecida, sem qualquer possibilidade de opção”.
Portanto, o Poder de Polícia (seja vinculado ou discricionário), assim como todos os atos administrativos, deve ser exercido em consonância com a Lei, sob pena de nulidade ou de inexistência. Mas, como se sabe, à administração pública é admitido o uso de meios indiretos (v.g. multa) ou meios diretos (v.g. apreensão de mercadorias) de coação para a garantia do interesse público.
Diga-se, outrossim, que o Poder de Polícia não se encerra nas atividades de Policiamento Ostensivo Fardado nem nas atividades de Polícia Judiciária. Do contrário, o Estado conta com diversos órgãos que atuam com Poder de Polícia, como as Agências Reguladoras, os órgãos da Fazenda Pública, os Departamentos de Trânsito, dentre outros.
Contudo, a Constituição Federal (elemento máximo dentro de um ordenamento) atribuiu às policias militares o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública (§5º do art. 144), de forma que devem os policiais militares atuarem (com observância da Lei especifica que regulamente sua atividade) em consonância com tal disposição constitucional.
3.1 A BUSCA PESSOAL ADMINISTRATIVA E A PREVISÃO LEGAL
Seria possível objetar que a Lei não estabelece uma “busca pessoal administrativa” especifica para a atividade policial. Ocorre que esse questionamento encontra vários problemas.
De início, qual seria a forma mais adequada de um Policial proceder ao verificar uma conduta (frise-se, conduta) suspeita? Ora, não tem como o Policial saber se uma pessoa em atitude suspeita está portando objeto de crime, sobrando apenas a possibilidade de abordagem e revista. Não se pode fechar os olhos para o fato de que os Policiais, sobretudo os mais experientes, tem a capacidade (a perícia, a habilidade) de reconhecer alguém que está em uma atitude suspeita, considerando o grande número de ocorrências que atendem diariamente e a consequente destreza que adquirem com o tempo de profissão.
Além disso, não é possível reclamar que uma busca pessoal administrativa é ilegal ou inconstitucional pois trata-se de uma decorrência da atribuição à Polícia de garantia da ordem pública, a qual se realiza, dentre outras formas, pelas atividades de fiscalização, conforme analisa Roberto Botelho:
Ora, é a CRFB quem garante, de forma muito cristalina e nítida, a competência das Polícias Militares do Brasil, para que, em face do exercício do Poder de Polícia, e dentro de seus atributos, não somente possam, como devem abordar as pessoas em via pública e, por consequência, realizar sempre a busca pessoal, tendo em vista que ela, de molde algum,
Assim, aqueles que criticam as buscas e revistas pessoais realizadas pelos policiais em decorrência do Poder de Polícia limitam-se a apenas criticar, mas não arriscam propor uma solução para o caso.
Soma-se a isso o fato de que o Supremo Tribunal Federal adota, quando necessário, a teoria dos poderes implícitos, segundo a qual quando a Constituição estabelece a um órgão determinada função, também dispensa a tal órgão todos os instrumentos necessários para a realização de tal função. Nesse sentido, julgou o Pretório Excelso em caso de poderes da Defensoria Pública:
EMENTA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI ORGÂNICA DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO. FORTALECIMENTO, PELO CONSTITUINTE DERIVADO REFORMADOR, DA MOLDURA NORMATIVO-CONSTITUCIONAL ATINENTE À DEFENSORIA PÚBLICA. PODER DE REQUISITAR DOCUMENTOS E INFORMAÇÕES PARA O EXERCÍCIO DAS FUNÇÕES. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. INSTRUMENTO DE VIABILIZAÇÃO DA MISSÃO INSTITUCIONAL E CONCRETIZAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS.
TEORIA DOS PODERES IMPLÍCITOS. […]. 5. Cumpre aplicar a teoria dos poderes implícitos, segundo a qual a outorga a órgão público de competência constitucional expressa importa em deferimento tácito, a esse mesmo órgão, dos meios e instrumentos necessários à integral consecução dos fins atribuídos. 6. Devem ser observadas as demais garantias constitucionais, a exemplo da proteção dos dados pessoais (CF, art. 5º LXXIX), com ressalva expressa àqueles cujo acesso dependa de autorização judicial. […].
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPEITO À AUTONOMIA FUNCIONAL DA DEFENSORIA PÚBLICA. TEORIA DOS PODERES IMPLÍCITOS E ADEQUAÇÃO, RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE NA PREVISÃO LEGAL DO PODER DE REQUISIÇÃO PARA O EFETIVO EXERCÍCIO DE SUA MISSÃO INSTITUCIONAL. CONSTITUCIONALIDADE DOS ARTS. 9º, XIV E XIX, E 36, IX, DA LEI COMPLEMENTAR 251/2003 DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. […].
4. Aplicação da teoria dos poderes implícitos – inherent powers –, com o reconhecimento de competências genéricas implícitas à Defensoria Pública que permitam o pleno e efetivo exercício de sua missão constitucional, ressalvados os elementos de informação que dependam de autorização judicial.
5. Ação Direta julgada improcedente.
[grifos nossos].
O mesmo Tribunal dispensa essa teoria quando há previsão legal expressa da atribuição de instrumento necessário para a consecução dos fins atribuídos pela Carta Magna a determinado órgão, como no caso dos poderes de investigação da Polícia Judiciária, in verbis:
Ementa: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. CONDUÇÃO DO INVESTIGADO À AUTORIDADE POLICIAL PARA ESCLARECIMENTOS. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 144, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DO ART. 6º DO CPP. DESNECESSIDADE DE MANDADO DE PRISÃO OU DE ESTADO DE FLAGRÂNCIA. DESNECESSIDADE DE INVOCAÇÃO DA TEORIA OU DOUTRINA DOS PODERES IMPLÍCITOS. PRISÃO CAUTELAR DECRETADA POR DECISÃO JUDICIAL, APÓS A CONFISSÃO INFORMAL E O INTERROGATÓRIO DO INDICIADO. LEGITIMIDADE. OBSERVÂNCIA DA CLÁUSULA CONSTITUCIONAL DA RESERVA DE JURISDIÇÃO. USO DE ALGEMAS DEVIDAMENTE JUSTIFICADO. CONDENAÇÃO BASEADA EM PROVAS IDÔNEAS E SUFICIENTES. NULIDADE PROCESSUAIS NÃO VERIFICADAS. LEGITIMIDADE DOS FUNDAMENTOS DA PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. ORDEM DENEGADA. I – A própria Constituição Federal assegura, em seu art. 144, § 4º, às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais. II – O art. 6º do Código de Processo Penal, por sua vez, estabelece as providências que devem ser tomadas pela autoridade policial quando tiver conhecimento da ocorrência de um delito, todas dispostas nos incisos II a VI. III – Legitimidade dos agentes policiais, sob o comando da autoridade policial competente (art. 4º do CPP), para tomar todas as providências necessárias à elucidação de um delito, incluindo-se aí a condução de pessoas para prestar esclarecimentos, resguardadas as garantias legais e constitucionais dos conduzidos. IV – Desnecessidade de invocação da chamada teoria ou doutrina dos poderes implícitos, construída pela Suprema Corte norte-americana e e incorporada ao nosso ordenamento jurídico, uma vez que há previsão expressa, na Constituição e no Código de Processo Penal, que dá poderes à polícia civil para investigar a prática de eventuais infrações penais, bem como para exercer as funções de polícia judiciária. […]. [grifos nossos].
Assim, o poder de fiscalização da Polícia Militar, consistente na busca administrativa, foi atribuído indiretamente a ela pela Constituição Federal, como corolário lógico da teoria dos poderes implícitos, adotada pelo STF.
Não bastasse isso, ainda, o Decreto-Lei 667/6920, a despeito de não fazer menção a busca pessoal administrativa, estabelece a competência das Policias Militares em seu art. 3º, das quais destacamos três:
Art. 3º – Instituídas para a manutenção da ordem pública e segurança interna nos Estados, nos Territórios e no Distrito Federal, compete às Polícias Militares, no âmbito de suas respectivas jurisdições: (Redação dada pelo Del nº 2010, de 1983)
a) executar com exclusividade, ressalvas as missões peculiares das Forças Armadas, o policiamento ostensivo, fardado, planejado pela autoridade competente, a fim de assegurar o cumprimento da lei, a manutenção da ordem pública e o exercício dos poderes constituídos; (Redação dada pelo Del nº 2010, de 1983)
b) atuar de maneira preventiva, como força de dissuasão, em locais ou áreas específicas, onde se presuma ser possível a perturbação da ordem; (Redação dada pelo Del nº 2010, de 12.1.1983)
c) atuar de maneira repressiva, em caso de perturbação da ordem, precedendo o eventual emprego das Forças Armadas; (Redação dada pelo Del nº 2010, de 1983
Vê-se que a Lei estabeleceu as funções, as competências, mas não especificou quais são os instrumentos para a consecução dessas funções, devendo, nesse caso, se aplicar a Teoria dos Poderes Implícitos, sob pena de tornar inerte a atribuição constitucional de garantia e preservação da ordem pública.
De arremate, o Superior Tribunal de Justiça já reconheceu, por diversas vezes, que a abordagem policial é corolário do Poder de Polícia:
PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO, NUMERAÇÃO RASPADA. BUSCA PESSOAL. FUNDADA SUSPEITA. NULIDADE. REVOLVIMENTO FÁTICO PROBATÓRIO. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. ABORDAGEM POLICIAL. PODER DE POLÍCIA. CRIME PERMANENTE. MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO. DESNECESSIDADE. DIREITO AO SILÊNCIO. RÉU QUE PERMANECEU CALADO NA FASE EXTRAJUDICIAL E JUDICIAL. ADVERTÊNCIA CONTIDA NOS INTERROGATÓRIOS POLICIAL E JUDICIAL. NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DO PREJUÍZO. WRIT NÃO CONHECIDO.
[…].
3. A abordagem policial decorre do poder de polícia inerente à atividade do Poder Público que, calcada na lei, tem o dever de prevenir delitos e condutas ofensivas à ordem pública.
4. Hipótese em que a ação dos policiais foi efetiva, pois resultou na prisão em flagrante do paciente por crime permanente, o qual não se exige mandado de busca e apreensão para sua efetivação. Precedentes.
5. De acordo com a Quinta Turma deste Tribunal, “revela-se despropositado que, a toda abordagem policial, o agente estatal advirta acerca do direito constitucional ao silêncio, sob pena de torná-los todos em suspeitos de práticas delitivas” (RHC 61.754/MS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, DJe 07/11/2016).
6. No caso em exame, o acórdão impugnado afirmou que “tanto no interrogatório realizado na fase investigativa quanto naquele posteriormente efetivado em juízo, houve expressa menção acerca da advertência do direito ao silêncio”, razão pela qual não há falar em cerceamento de defesa.
7. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça firmou entendimento no sentido de que o reconhecimento de nulidade exige a demonstração do prejuízo, à luz do art. 563 do Código de Processo Penal, segundo o princípio pas de nullité sans grief, o que não se verifica na espécie.
8. Habeas corpus não conhecido.
Por isso, considerando a determinação constitucional (e também legal), assim como a teoria dos poderes implícitos, é necessário que seja reconhecida a busca pessoal administrativa como medida legítima de garantia da ordem e segurança pública.
3.2 A BUSCA PESSOAL ADMINISTRATIVA E A ATUAÇÃO JURISDICIONAL
O Poder de Polícia exercido pela Polícia Militar quando de uma fiscalização ou de uma busca administrativa é um poder discricionário, já que, em se tratando dessas situações, é impossível que o legislador preveja todas as hipóteses em que a administração pública deva agir, de forma que a Constituição Federal adotou uma clausula geral, a de que às Polícias Militares cabe a preservação da ordem pública
(os lusos possuem clausula semelhante, a chamada clausula geral de polícia). No entanto, nem a Lei nem a Constituição estabelece os instrumentos para tal preservação, como mencionado alhures.
Sobre os atos discricionários, tem-se que não pode o Poder Judiciário se imiscuir no mérito destes atos, isto é, nas razões que levaram o agente público a tomar determinada decisão, já que foi o próprio legislador que deixou um espaço para a discricionariedade do agente público, o qual agirá conforme um critério de
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (Quinta Turma). Habeas Corpus Nº 385110/SC. Rel. Min. Ribeiro Dantas, 06 de jun. de 2017. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/. Acesso em: 16 de dezembro de 2022.
conveniência e oportunidade, de forma que, caso o magistrado adentre o mérito do ato, ele estará violando o princípio constitucional de separação dos poderes. Não obstante, pode o Poder Judiciário verificar se o ato em questão possui todos os seus elementos incólumes, como a moralidade, de forma a considerar a razoabilidade, o comportamento esperado do homem-médio e levando em consideração que não pode substituir os valores morais do administrador pelos seus próprios. Nesse sentido são os ensinamentos de Maria Sylvia:
A distinção entre atos discricionários e atos vinculados tem importância fundamental no que diz respeito ao controle que o Poder Judiciário sobre eles exerce.
[…].
Com relação aos atos discricionários, o controle judicial é possível mas terá que respeitar a discricionariedade administrativa nos limites em que ela é assegurada à Administração Pública pela lei.
Isto ocorre precisamente pelo fato de ser a discricionariedade um poder delimitado previamente pelo legislador; este, ao definir determinado ato, intencionalmente deixa um espaço para livre decisão da Administração Pública, legitimando previamente a sua opção; qualquer delas será legal. Daí por que não pode o Poder Judiciário invadir esse espaço reservado, pela lei, ao administrador, pois, caso contrário, estaria substituindo, por seus próprios critérios de escolha, a opção legítima feita pela autoridade competente com base em razões de oportunidade e conveniência que ela, melhor do que ninguém, pode decidir diante de cada caso concreto.
A rigor, pode-se dizer que, com relação ao ato discricionário, o Judiciário pode apreciar os aspectos da legalidade e verificar se a Administração não ultrapassou os limites da discricionariedade; neste caso, pode o Judiciário invalidar o ato, porque a autoridade ultrapassou o espaço livre deixado pela lei e invadiu o campo da legalidade.
[…].
Começa a surgir no direito brasileiro forte tendência no sentido de limitar-se ainda mais a discricionariedade administrativa, de modo a ampliar-se o controle judicial. Essa tendência verifica-se com relação às noções imprecisas que o legislador usa com frequência para designar o motivo e a finalidade do ato (interesse público, conveniência administrativa, moralidade, ordem pública etc.). Trata-se daquilo que os doutrinadores alemães chamam de “conceitos legais indeterminados” (cf. Martin Bullinger, 1987).
[…]..
Se, para delimitação do conceito, houver necessidade de apreciação subjetiva, segundo conceitos de valor, haverá discricionariedade. É o que ocorre quando a lei prevê a remoção do funcionário para atender a necessidade do serviço.
[…] não pode [o Poder Judiciário] examinar os critérios de valor em que se baseou a autoridade administrativa, porque estaria penetrando no exame da discricionariedade. Mesmo neste caso, alguns autores apelam para o princípio da razoabilidade para daí inferir que a valoração subjetiva tem que ser feita dentro do razoável, ou seja, em consonância com aquilo que, para o senso comum, seria aceitável perante a lei.
Existem situações extremas em que não há dúvida possível, pois qualquer pessoa normal, diante das mesmas circunstâncias, resolveria que elas são certas ou erradas, justas ou injustas, morais ou imorais, contrárias ou favoráveis ao interesse público; e existe uma zona intermediária, cinzenta, em que essa definição é imprecisa e dentro da qual a decisão será discricionária, colocando-se fora do alcance do
Poder Judiciário (cf. Celso Antônio Bandeira de Mello, in RDP 65/27-38; Lúcia Valle Figueiredo, 1986:120-135; Regina Helena Costa, 1988:79-108).
Por exemplo, o conceito de notável saber jurídico permite certa margem de discricionariedade na referida zona cinzenta; mas não a permite quando os elementos de fato levam à conclusão, sem sombra de dúvida, de que o requisito constitucional não foi atendido.
Dentro desses parâmetros é que caberá ao Poder Judiciário examinar a moralidade dos atos administrativos, com fundamento no artigo 37, caput, e artigo 5º, LXXIII, da Constituição, este último referente à ação popular. Não cabe ao magistrado substituir os valores morais do administrador público pelos seus próprios valores, desde que uns e outros sejam admissíveis como válidos dentro da sociedade; o que ele pode e deve invalidar são os atos que, pelos padrões do homem comum, atentam manifestamente contra a moralidade. Não é possível estabelecer regras objetivas para orientar a atitude do juiz. Normalmente, os atos imorais são acompanhados de grande clamor público, até hoje sem sensibilizar a Administração. Espera-se que o Judiciário se mostre sensível a esses reclamos. Essa tendência que se observa na doutrina, de ampliar o alcance da apreciação do Poder Judiciário, não implica invasão na discricionariedade administrativa; o que se procura é colocar essa discricionariedade em seus devidos limites, para distingui-la da interpretação (apreciação que leva a uma única solução, sem interferência da vontade do intérprete) e impedir as arbitrariedades que a Administração Pública pratica sob o pretexto de agir discricionariamente.
Pensemos na seguinte situação: um sujeito encontra-se em um ponto de tráfico de drogas, em um dia de calor, trajando roupas pesadas de frio (como uma jaqueta ou moletom). Ora, qualquer pessoa de mediano juízo, ao se deparar com tal comportamento, o considerará um comportamento, no mínimo, estranho, suspeito.
Novamente com Roth:
[as policias militares] sempre atuaram e atuarão na via pública, durante o policiamento ostensivo para a preservação da ordem pública, abordando pessoas, quando houver a necessidade de se aferir ou verificar qualquer situação que seja analisada pelo policial como situação que desperte uma anormalidade, suscite um comportamento que, fugindo do que é esperado pela visão do policial, demande a ação policial, preventiva, seja abordando e pedindo documentos para identificação da pessoa, seja para esclarecer o porquê do comportamento estranho ali em concreto verificado.
Se após essa primeira medida, tudo ficar esclarecido, certamente o cidadão abordado irá ser liberado, caso contrário, poderá o policial realizar a busca pessoal, também preventiva, para a constatação da existência de armas, drogas ou outro material ilícito que esteja portando ou transportando.
Em síntese, uma vez realizada a busca pessoal preventiva, nos moldes acima expostos, não pode o poder judiciário verificar o mérito desta ação, mas apenas e tão somente se foram preenchidos todos os requisitos do ato administrativo em questão, numa análise de, sobretudo, sua legalidade.
Além disso, não cabe dizer que a atividade policial de abordagem (a nossa Busca Pessoal Administrativa) represente violação às garantias e direitos de intimidade, privacidade e liberdade como consequência do chamado “racismo estrutural”. Nesse sentido, explica Azor Lopes:
Nessa linha, “tirocínio policial” tem a mesma natureza semântica que “prudente arbítrio do juiz”, salvo se o processo de interpretação semântica estiver sofrendo efeitos de um preconceito profissional estrutural, a partir da ideia de que os saberes que compõe um destes seriam mais elevados que os que compõe o outro.
A expressão “tirocínio policial” não pode sofrer uma carga semântica depreciativa ou negativa que inevitavelmente conduz à arbitrariedade, quando ela compõe o acervo linguístico de um meio e se define como um saber empírico, adquirido a partir da observação do meio e das experiências vividas; negar esse saber ou deprecia-lo seria o mesmo que dizer que decanos dos tribunais teriam o mesmo nível de maturidade profissional que juízes ainda sem vitaliciedade; seria desprezar o saber acumulado dos professores catedráticos e livre docentes, colocando-os no mesmo patamar do iniciante professor-adjunto.
O policial não é dotado de tirocínio simplesmente pela posse no cargo, assim como o magistrado não adquire o atributo de prudente tão só por atingir a vitaliciedade; não se trata de atributo normativo, mas cultural fruto de expertise e habilidades contruidas28.
Por detrás desse esforço de deslegitimação do poder de polícia surge – tanto no campo acadêmico quanto no case julgado pelo Superior Tribunal de Justiça – como hipótese recorrente o chamado “racismo estrutural”. Exemplo mais recente dessa tese é a pesquisa conduzida pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania29 do Rio de Janeiro, divulgada em fevereiro de 2015, entrevistando 739 transeuntes de áreas de grande circulação em maio de 2021 e, ainda outros, em grupos focais (jovens moradores de favelas, entregadores, motoristas de aplicativos, mulheres e policiais) demonstrando que jovens negros são os mais visados nessas abordagens policiais. Os pesquisadores até tiveram o cuidado de contratar o dado de que o extrato de negros na população da cidade do Rio de Janeiro é 48%, mas concluiu pela hipótese do racismo estrutural, analisando o dado percentual de maior incidência de abordagens a pessoas negras (63%), sendo que 17% delas já teria passado por mais de 10 abordagens policiais.
A hipótese do chamado “racismo estrutural” carece de pesquisas mais detalhadas e qualitativas. Veja-se que uma pesquisa30 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2019 revelou que no mercado de trabalho 29,9% dos cargos gerenciais são ocupados por negros, negros compõe 32,9% da população situada abaixo da linha de pobre [sic] (renda diária inferior a US$5,50), 29,8% de negros com idade acima de 15 anos são analfabetos e que, em 2017, foi de 185 a taxa de homicídios por grupo de 100 mil, no estrato de jovens negros com idade entre 15 e 29 anos.
[…].
Com destaque aos níveis de violência apontados, resta estabelecer o porquê desses indicadores de preponderância, sendo razoável traçar como hipóteses alternativas à de existência de padrões de conduta policial orientados pelo chamado “racismo estrutural”: (1) os territórios de exclusão social são mais férteis ao domínio da criminalidade organizada centrada no tráfico de drogas e de mais probabilidade de cooptação de jovens negros com baixa escolaridade e socialmente excluidos; (2) dessa primeira hipótese decorrerem políticas de estado, na tentativa de combate ao crime organizado, orientadas à maior intervenção policial nesses espaços; (3) a percepção, pelos agentes policiais que atuam nesses espaços sociais, de comportamentos individuais singulares próprios de criminosos habituais, levando à maior incidência de abordagens sobre esses suspeitos.
Razoável, no plano da mesma lógica cientifica, suscitar a seguinte hipótese: o “racismo estrutural” também teria contaminado o Poder Judiciário, de tal forma que os magistrados tendem ao preconceito racial no momento das condenações? Justifica-se a hipótese: dados ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revelam que em julho de 2022 o Brasil mantém 910.147 pessoas privadas de liberdade e outras 358.532 contra as quais há mandados de prisão pendentes de cumprimento; o último censo penitenciário publicado pelo Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) é de 2014 e nesse se mostra que “a porcentagem de pessoas negras no sistema prisional é de 67%, na população brasileira em geral, a proporção é significativamente menor (51%)”.
Assim, tanto o ato de interpretar a norma para julgar um caso concreto, quanto aplicar a mesma norma na condução de políticas públicas de segurança, não passa de uma opção em busca de um agir volitivo que, ao menos se espera, seja vocacionado para o bem-comum com respeito aos direitos individuais e jamais à discriminação de qualquer ordem […].
Por essas razões, ainda que seja necessário a fundada suspeita do agente da administração pública (o Policial Militar) para a busca pessoal, fato é que quando um policial aborda uma pessoa, presumivelmente o faz em razão de uma fundada suspeita (costumeiramente, o policial faz referência a uma pessoa “em atitude suspeita”). Vale dizer, outrossim, que a Polícia também é composta de pessoas que fazem ou fizeram parte de grupos socialmente marginalizados.
Anote-se que, diversamente do que se alega, são várias as razões pelas quais levam o policial a suspeitar e abordar uma pessoa, é dizer, são várias as possíveis atitudes suspeitas: a) uso de tatuagem relacionada ao crime organizado (v.g. carpa e palhaço); b) pessoa parada próxima a ponto de frequente tráfico de drogas; c) frequentar lugares costumeiramente frequentados por egressos do sistema prisional ou com ficha criminal; d) trajar roupas incompatíveis com o momento climático (v.g. roupas de frio em dias de calor); e) trafegar em alta velocidade; f) trafegar durante o período noturno com o veículo cheio de ocupantes; g) empreender fuga ao se deparar com uma viatura da Polícia, dentre outros.
Ora, todas essas atitudes revelam um certo grau idiossincrático, porquanto destoante daquilo que a maioria da população faria, o que, apesar disso, não são aptos a justificar uma prisão, mas sim uma abordagem (e busca pessoal administrativa) e, uma vez verificado que, de fato, a pessoa carregava elemento de crime, resta demonstrada que aquele comportamento idiossincrático denunciava um crime.
Assim, presumir que a Polícia aborda pessoas com base em discriminação seria imputar ao policial, de plano, a prática de atos discriminatórios, o que não se sustenta, seja pela falta de provas, seja pela falta de concatenação lógico-fática dessa tese frente a todos os elementos aqui declinados
4 TRANSPLANTES JURÍDICOS
Quando se quer trazer um mecanismo de um ordenamento jurídico alienígena, deve-se ter em mente que não se pode simplesmente “transplanta-lo”, mas deve-se “traduzi-lo”. O Professor Marcos Zilli, do Departamento de Direito Processual da Universidade de São Paulo, explica muito bem a diferença entre uma tradução e um transplante, utilizando dos escritos de Máximo Langer:
Em estudo desenvolvido no campo do processo penal comparado, e mais especificamente dos mecanismos de solução negociada do conflito penal, Langer posiciona-se entre os críticos ao uso do termo transplante como ferramental [sic] apto a captar os diferentes resultados provenientes das interações entre os sistemas jurídicos. Propõe, assim, o uso da expressão “tradução”. Entende ser esta a mais adequada para distinguir as fontes linguísticas entre os sistemas de origem e o receptor, permitindo, assim, identificar as diferenças de sentido ocorridas no processo de aproveitamento de institutos estrangeiros.
[…].
O intercâmbio entre sistemas jurídicos é inevitável e, ademais, salutar. A inspiração dos modelos estrangeiros deve vir cercada de cuidados. A análise criteriosa supõe não só conhecimento do funcionamento do modelo que inspira, como também conhecimento do modelo que se busca aperfeiçoar.
[…]. Por desconsiderarem a realidade do sistema receptor, os transplantes jurídicos não são a solução. […].
No entanto, os Tribunais Superiores, notadamente o Superior Tribunal de Justiça (STJ), as vezes vão na contramão dessa necessidade. Com o escopo de demonstrar essa assertiva, trouxemos à baila recente julgado do referido Tribunal, sobre o qual a comunidade jurídica – sobretudo aquela relacionada ao Direito Militar e Segurança Pública – teceu severas (porem justas e devidas) críticas. É o Habeas Corpus 158.580:
RECURSO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. BUSCA PESSOAL. AUSÊNCIA DE FUNDADA SUSPEITA. ALEGAÇÃO VAGA DE ATITUDE SUSPEITA. INSUFICIÊNCIA. ILICITUDE DA PROVA OBTIDA. TRANCAMENTO DO PROCESSO. RECURSO PROVIDO.
- Exige-se, em termos de standard probatório para busca pessoal ou veicular sem mandado judicial, a existência de fundada suspeita (justa causa) baseada em um juízo de probabilidade, descrita com a maior precisão possível, aferida de modo objetivo e devidamente justificada pelos indícios e circunstâncias do caso concreto de que o indivíduo esteja na posse de drogas, armas ou de outros objetos ou papéis que constituam corpo de delito, evidenciando-se a urgência de se executar a diligência.
- Entretanto, a normativa constante do art. 244 do CPP não se limita a exigir que a suspeita seja fundada. É preciso, também, que esteja relacionada à posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito. Vale dizer, há uma necessária referibilidade da medida, vinculada à sua finalidade legal probatória, a fim de que não se converta em salvo conduto para abordagens e revistas exploratórias (fishing expeditions), baseadas em suspeição genérica existente sobre indivíduos, atitudes ou situações, sem relação específica com a posse de arma proibida ou objeto (droga, por exemplo) que constitua corpo de delito de uma infração penal. O art. 244 do CPP não autoriza buscas pessoais praticadas como rotina ou praxedo policiamento ostensivo, com finalidade preventiva e motivação exploratória, mas apenas buscas pessoais com finalidade probatória e motivação correlata.
- Não satisfazem a exigência legal, por si sós, meras informações de fonte não identificada (e.g. denúncias anônimas) ou intuições e impressões subjetivas, intangíveis e não demonstráveis de maneira clara e concreta, apoiadas, por exemplo, exclusivamente, no tirocínio policial. Ante a ausência de descrição concreta e precisa, pautada em elementos objetivos, a classificação subjetiva de determinada atitude ou aparência como suspeita, ou de certa reação ou expressão corporal como nervosa, não preenche o standard probatório de fundada suspeitaexigido pelo art. 244 do CPP.
- O fato de haverem sido encontrados objetos ilícitos independentemente da quantidade após a revista não convalida a ilegalidade prévia, pois é necessário que o elemento fundada suspeita de posse de corpo de delito seja aferido com base no que se tinha antes da diligência. Se não havia fundada suspeita de que a pessoa estava na posse de arma proibida, droga ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, não há como se admitir que a mera descoberta casual de situação de flagrância, posterior à revista do indivíduo, justifique a medida.
- A violação dessas regras e condições legais para busca pessoal resulta na ilicitude das provas obtidas em decorrência da medida, bem como das demais provas que dela decorrerem em relação de causalidade, sem prejuízo de eventual responsabilização penal do(s) agente(s) público(s) que tenha(m) realizado a diligência.
- Há três razões principais para que se exijam elementos sólidos, objetivos e concretos para a realização de busca pessoal vulgarmente conhecida como dura, geral, revista, enquadro ou baculejo , além da intuição baseada no tirocínio policial:
a) evitar o uso excessivo desse expediente e, por consequência, a restrição desnecessária e abusiva dos direitos fundamentais à intimidade, à privacidade e à liberdade (art. 5º, caput, e X, da Constituição Federal), porquanto, além de se tratar de conduta invasiva e constrangedora mesmo se realizada com urbanidade, o que infelizmente nem sempre ocorre , também implica a detenção do indivíduo, ainda que por breves instantes;
b) garantir a sindicabilidade da abordagem, isto é, permitir que tanto possa ser contrastada e questionada pelas partes, quanto ter sua validade controlada a posteriori por um terceiro imparcial (Poder Judiciário), o que se inviabiliza quando a medida tem por base apenas aspectos subjetivos, intangíveis e não demonstráveis;
c) evitar a repetição ainda que nem sempre consciente de práticas que reproduzem preconceitos estruturais arraigados na sociedade, como é o caso do perfilamento racial, reflexo direto do racismo estrutural.
7. Em um país marcado por alta desigualdade social e racial, o policiamento ostensivo tende a se concentrar em grupos marginalizados e considerados potenciais criminosos ou usuais suspeitos, assim definidos por fatores subjetivos, como idade, cor da pele, gênero, classe social, local da residência, vestimentas etc. Sob essa perspectiva, a ausência de justificativas e de elementos seguros a legitimar a ação dos agentes públicos diante da discricionariedade policial na identificação de suspeitos de práticas criminosas pode fragilizar e tornar írritos os direitos à intimidade, à privacidade e à liberdade.
8. Os enquadros se dirigem desproporcionalmente aos rapazes negros moradores de favelas dos bairros pobres das periferias. Dados similares quanto à sobrerrepresentação desse perfil entre os suspeitos da polícia são apontados por diversas pesquisas desde os anos 1960 até hoje e em diferentes países do mundo. Trata-se de um padrão consideravelmente antigo e que ainda hoje se mantém, de modo que, ao menos entre os estudiosos da polícia, não existe mais dúvida de que o racismo é reproduzido e reforçado através da maior vigilância policial a que é submetida a população negra. Mais do que isso, os policiais tendem a enquadrar mais pessoas jovens, do sexo masculino e de cor negra não apenas como um fruto da dinâmica da criminalidade, como resposta a ações criminosas, mas como um enviesamento no exercício do seu poder contra esse grupo social, independentemente do seu efetivo engajamento com condutas ilegais, por um direcionamento prévio do controle social na sua direção(DA MATA, Jéssica, A Política do Enquadro, São Paulo: RT, 2021, p. 150 e 156).
9. A pretexto de transmitir uma sensação de segurança à população, as agências policiais em verdadeiros “tribunais de rua” cotidianamente constrangem os famigerados elementos suspeitoscom base em preconceitos estruturais, restringem indevidamente seus direitos fundamentais, deixam lhes graves traumas e, com isso, ainda prejudicam a imagem da própria instituição e aumentam a desconfiança da coletividade sobre ela.
10. Daí a importância, como se tem insistido desde o julgamento do HC n. 598.051/SP (Rel. Ministro Rogerio Schietti, 6ª T., DJe 15/3/2021), do uso de câmeras pelos agentes de segurança, a fim de que se possa aprimorar o controle sobre a atividade policial, tanto para coibir práticas ilegais, quanto para preservar os bons policiais de injustas e levianas acusações de abuso. Sobre a gravação audiovisual, aliás, é pertinente destacar o recente julgamento pelo Supremo Tribunal Federal dos Embargos de Declaração na Medida Cautelar da ADPF n. 635 (“ADPF das Favelas”, finalizado em 3/2/2022), oportunidade na qual o Pretório Excelso em sua composição plena e em consonância com o decidido por este Superior Tribunal no HC n. 598.051/SP reconheceu a imprescindibilidade de tal forma de monitoração da atividade policial e determinou, entre outros pontos, que “o Estado do Rio de Janeiro, no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, instale equipamentos de GPS e sistemas de gravação de áudio e vídeo nas viaturas policiais e nas fardas dos agentes de segurança, com o posterior armazenamento digital dos respectivos arquivos”.
11. Mesmo que se considere que todos os flagrantes decorrem de busca pessoal o que por certo não é verdade , as estatísticas oficiais das Secretarias de Segurança Pública apontam que o índice de eficiência no encontro de objetos ilícitos em abordagens policiais é de apenas 1%; isto é, de cada 100 pessoas revistadas pelas polícias brasileiras, apenas uma é autuada por alguma ilegalidade. É oportuno lembrar, nesse sentido, que, em Nova Iorque, o percentual de eficiência das stop and frisks era de 12%, isto é, 12 vezes a porcentagem de acerto da polícia brasileira, e, mesmo assim, foi considerado baixo e inconstitucional em 2013, no julgamento da class action Floyd, et al. v. City of New York, et al. pela juíza federal Shira Scheindlin.
12. Conquanto as instituições policiais hajam figurado no centro das críticas, não são as únicas a merecê-las. É preciso que todos os integrantes do sistema de justiça criminal façam uma reflexão conjunta sobre o papel que ocupam na manutenção da seletividade racial. Por se tratar da porta de entrada no sistema, o padrão discriminatório salta aos olhos, à primeira vista, nas abordagens policiais, efetuadas principalmente pela Polícia Militar. No entanto, práticas como a evidenciada no processo objeto deste recurso só se perpetuam porque, a pretexto de combater a criminalidade, encontram respaldo e chancela, tanto de delegados de polícia, quanto de representantes do Ministério Público a quem compete, por excelência, o controle externo da atividade policial (art. 129, VII, da Constituição Federal) e o papel de custos iuris , como também, em especial, de segmentos do Poder Judiciário, ao validarem medidas ilegais e abusivas perpetradas pelas agências de segurança.
13. Nessa direção, o Manual do Conselho Nacional de Justiça para Tomada de Decisão na Audiência de Custódia orienta a que: “Reconhecendo o perfilamento racial nas abordagens policiais e, consequentemente, nos flagrantes lavrados pela polícia, cabe então ao Poder Judiciário assumir um papel ativo para interromper e reverter esse quadro, diferenciando-se dos atores que o antecedem no fluxo do sistema de justiça criminal”.
14. Em paráfrase ao mote dos movimentos antirracistas, é preciso que sejamos mais efetivos ante as práticas autoritárias e violentas do Estado brasileiro, pois enquanto não houver um alinhamento pleno, por parte de todos nós, entre o discurso humanizante e ações verdadeiramente transformadoras de certas práticas institucionais e individuais, continuaremos a assistir, apenas com lamentos, a morte do presente e do futuro, de nosso país e de sua população mais invisível e vulnerável. E não realizaremos o programa anunciado logo no preâmbulo de nossa Constituição, de construção de um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos.
15. Na espécie, a guarnição policial “deparou com um indivíduo desconhecido em atitude suspeita” e, ao abordá-lo e revistar sua mochila, encontrou porções de maconha e cocaína em seu interior, do que resultou a prisão em flagrante do recorrente. Não foi apresentada nenhuma justificativa concreta para a revista no recorrente além da vaga menção a uma suposta atitude suspeita, algo insuficiente para tal medida invasiva, conforme a jurisprudência deste Superior Tribunal, do Supremo Tribunal Federal e da Corte Interamericana de Direitos Humanos.
16. Recurso provido para determinar o trancamento do processo.27
Na temática dos transplantes, a crítica a ser feita a este julgado é que não se aplica o standard probatório para buscas pessoais ou veiculares. Isso porque não há sentido em dispensar a expressão standard probatório àquelas decisões que são tomadas antes da atividade probatória, já que não houve, ainda, produção probatória em sua completude (na acepção técnica), mormente se consideramos que a prova só se forma após o efetivo contraditório.
Não se olvida que “ […], nada impede que a técnica dos standards de prova seja utilizada em níveis distintos, com vista às decisões distintas a serem proferidas ao longo da persecução penal”28, no entanto, pela própria natureza da busca pessoal, não é razoável exigir que ela seja “descrita com a maior precisão possível, aferida de modo objetivo e devidamente justificada pelos indícios e circunstancias”, já que, nesse caso, a mens legis era o de afastar o arbítrio policial, a busca pessoal sem a existência de motivos, limitando-se, assim, o poder estatal.
Entender diversamente, data vênia, abre espaço para que não haja mais buscas pessoais, salvo com mandado judicial, pois exigir do agente estatal que explique pormenorizadamente a razão pela qual em determinado momento julgou que determinada pessoa estava em uma especifica atitude suspeita e, por isso, procedeu na busca pessoal, é desconsiderar o fator humano que está em voga em situações como essa.
Não obstante, talvez a principal crítica a ser feita é que o julgado não diferencia a busca pessoal processual penal e a busca pessoal administrativa. Essa ausência de diferenciação abre espaço, data máxima vênia, para mais equívocos, como por exemplo as chamadas fishing expeditions ou a adoção da Problable Cause.
Ora, esses institutos, do direito norte-americano, não podem simplesmente serem “importados” da legislação estrangeira, porque desconsideram as particularidades do sistema brasileiro, especificamente o Poder de Polícia das autoridades de Polícia Administrativa. Diferentemente das Policias norte-americanas, a Polícia brasileira não realiza o chamado “ciclo completo de polícia”, é dizer, ou atuam na atividade preventiva ou atuam na atividade repressiva:
[…] a Polícia preventiva atua na realização de múltiplas atividades antes do delito, para evita-lo, enquanto a Polícia repressiva atua com a eclosão do delito, na sua repressão e na sua investigação.
Dai a necessidade de registrarmos, de pronto, o modelo de Polícia adotado pelo Brasil, com origem francesa, consistente na dualidade de Polícia Preventiva e de Polícia Judiciária, com atividades diversas e que não se confundem […].
Assim sendo, as ideias de fishing expedition e probable cause deveriam, antes de entrarem no ordenamento brasileiro, serem adaptadas para ele, sob pena de prejudicar as atividades de prevenção.
5 DA BUSCA DOMICILIAR
A busca domiciliar vem disciplinada pelo Código de Processo Penal e, em regra, depende de autorização judicial. Falamos em regra porque é possível que, em situações excepcionais, expressas pela própria Carta Magna, é possível o ingresso em domicílio alheio sem mandado.
Nesse sentido, é possível o ingresso em domicilio alheio, sem mandado, em caso de flagrante delito, desastre ou para prestar socorro.
Esta medida é possível para: prender criminosos; apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos, instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos, armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso, cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu poder, quando haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à elucidação do fato; descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu; apreender pessoas vítimas de crimes ou colher qualquer elemento de convicção.
Quanto ao momento, tem-se que referida busca pode se dar de noite (o que dependerá de consentimento do morador) ou de dia (independentemente de consentimento do morador).
O mandado de busca deve ser minucioso, no sentido de descrever, o mais precisamente possível, a casa em que será realizada a diligencia e seu morador,
devendo o agente executor, antes de entrar na residência, ler o mandado ao morador ou a quem o represente. Caso o morador se recuse a franquear a entrada durante o dia, é lícito o arrombamento de porta.
Uma dúvida comum é se o agente policial poderia invadir uma residência em razão de estar perseguindo alguém. Ora, estando em situação de flagrância, é possível entrar na residência, do fugitivo ou de terceiro, em razão do permissivo constitucional. Em ambos os casos ter-se-iam flagrante delito, seja no caso de invasão do domicilio do fugitivo, estando ele sendo perseguido na forma do art. 302, inc. III do CPP, seja no caso de invasão de domicilio de terceiro, situação na qual o fugitivo estaria cometendo o crime de violação de domicilio e, por consequência, estaria em situação de flagrância..
Quando se fala em busca domiciliar, dois elementos são elementos de intenso debate: o conceito de domicilio e o conceito de dia.
O conceito de domicílio, para fins processuais penais, é extraído do art. 150, §4º do Código Penal e compreende: qualquer compartimento habitado; aposento ocupado de habitação coletiva (v.g. quarto de hotel); compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade (v.g. consultório médico; escritório de advocacia). Também compreende, toda a extensão do território rural (para fins do art. 5º, §5º do Estatuto do Desarmamento).
Já o conceito de dia é um pouco mais problemático, como demonstra Renato Brasileiro:
Doutrina e jurisprudência sempre divergiram acerca do conceito de dia. Em
virtude das dimensões continentais do território brasileiro, em que o nascer e o pôr do sol ocorrem em horários diversos a depender da região do país em que estivermos, sempre prevaleceu, aos olhos da jurisprudência, o critério físico-astronômico, considerando como dia o período compreendido entre a aurora e o crepúsculo.304 Outros doutrinadores, todavia, sempre preferiram usar um critério cronológico, mais seguro, considerando como dia o período compreendido entre 6:00h e 18:00h.305 Por fim, uma última corrente (mista) trabalhava com a aplicação conjunta de ambos os critérios, o que, em tese, atenderia à finalidade constitucional de maior proteção ao domicílio durante a noite, resguardando-se a possibilidade de invasão domiciliar com autorização judicial, mesmo após as 18:00 horas, desde que, ainda, não fosse noite, como ocorre, por exemplo, naquelas localidades em que se adota o horário de verão.
Com o objetivo de afastar quaisquer controvérsias acerca da matéria, a nova Lei de Abuso de Autoridade passou a criminalizar o cumprimento de mandado
de busca e apreensão domiciliar após as 21h ou antes das 5h (Lei n. 13.869/19, Art. 22, §1º, III), positivando, enfim, pelo menos para fins de
Cremos que, futuramente, prevalecerá o conceito de dia e noite estabelecido pela Lei de Abuso de Autoridade, sem qualquer alteração, por ser um critério estabelecido pela Lei e, por isso, mais juridicamente seguro, sendo esse, também, o entendimento de Renato Brasileiro.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Inicialmente, buscou-se especificar a natureza jurídica da busca pessoal processual, atingindo-se a conclusão de que a busca pessoal é meio de obtenção de prova por ser uma técnica de obtenção de elementos de prova ou de indícios (os quais, por sua vez, são retirados das fontes de prova).
Verificou-se que ela não poderia ser prova (porque não há prova sem a instrução e o efetivo contraditório) nem elemento de prova, de cognição ou indício, já que são elementos ligados ao fato, ao passo que a busca é um procedimento. Também não pode ser ela uma fonte de prova, já que fonte de prova é de onde se extrai a prova, sendo a busca um dos instrumentos de extração dessa prova.
Em seguida, se analisou a busca pessoal processual sob a perspectiva do garantismo constitucional e do princípio da proporcionalidade, chegando-se a conclusão de que sendo a segurança pública um direito fundamental de toda pessoa, consoante disposição expressa na Constituição Federal (CRFB), direito essencial para a garantia de outros direitos, como o da vida, da liberdade, o da propriedade, dentre outros e sendo a busca pessoal processual um instrumento importante da administração pública, é inviável a anulação massiva de processos sob o argumento de que representaria violação à presunção de inocência e à intimidade do indivíduo, sendo necessário a busca do equilíbrio entre os direitos, e não apenas a garantia dos direitos dos réus.
Após a análise da busca pessoal processual, foi estabelecida uma diferenciação entre a busca pessoal processual e a busca pessoal preventiva, a qual batizamos de busca pessoal administrativa.
A diferença basilar entre as duas buscas é que a busca pessoal processual é uma atividade própria do ramo processual penal, ao passo que a busca pessoal administrativa é corolário do poder de polícia da administração pública.
A busca pessoal administrativa, a despeito de não haver previsão legal expressa, é um instrumento a disposição das policias reconhecido pela Teoria dos Poderes Implícitos, já que a Constituição Federal atribuiu às Policias Militares o dever de garantia da ordem pública. Referida teoria, oriunda do direito norte-americano, já foi diversas vezes reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, de forma que ela só não é aplicada quando a própria Lei atribuir expressamente os poderes necessários (o que não é o caso).
Além disso, não pode o poder judiciário se imiscuir no mérito do ato administrativo de busca pessoal administrativa pois se trata de um ato discricionário, de forma que o Judiciário pode apenas verificar a legalidade de tal ato
Importante mencionar que não se pode presumir que a Polícia aborda pessoas com base em discriminação, tanto pela falta de provas, tanto pela falta de lógica dessa asserção, já que são vários os motivos que levam um Policial a abordar uma pessoa, além do fato de que muitos policiais integram (ou já integraram) os grupos considerados socialmente marginalizados.
Noutro giro, a “importação” de elementos do direito norte-americano deve ser feito com muita cautela, para não significar um “transplante” mas sim uma “tradução”. Assim, quando se fala em fishing expedition, probable cause ou standard de prova, deve-se tem em mente as características do sistema receptor (sistema brasileiro), sob pena de tornar inerte algumas disposições constitucionais e legais.
Assim, por exemplo, não se pode falar em standard de prova em relação a uma busca pessoal, porquanto a busca pessoal não se realiza sem motivos, de forma que o legislador, ao determinar que ela se dará em caso de “fundada suspeita” buscava apenas afastar o arbítrio da administração pública, de forma que não ocorresse buscas pessoais sem razão. Ora, exigir do agente estatal que explique pormenorizadamente a razão pela qual em determinado momento julgou que determinada pessoa estava em uma especifica atitude suspeita e, por isso, procedeu na busca pessoal, é desconsiderar o fator humano em situações como essa, de forma a abrir espaço para que ocorra apenas buscas pessoais com mandado judicial.
Já sobre a fishing expedition ou a probable cause, tem-se que são institutos jurídicos que devem ser adaptados ao sistema brasileiro, pois desconsideram dois fatores importantes: I) a polícia brasileira não realiza o chamado “ciclo completo de polícia”, sendo uma responsável pela atividade preventiva (Polícia Militar) e outra responsável pela atividade de investigação (Policia Civil), diferentemente do sistema norte-americano; II) as atividades da Polícia Militar se desenvolvem conforme o Direito Administrativo, não conforme o Direito Processual Penal. Assim sendo, não se pode simplesmente “importar” tais institutos sem considerar as particularidades do ordenamento brasileiro.
Finalmente, a busca domiciliar. A busca domiciliar não enfrenta tantos grandes problemas como a busca pessoal, no entanto, alguns pontos merecem bastante atenção. Por exemplo os conceitos de domicilio e de dia, assim como em quais hipóteses a situação de flagrância permitiria o ingresso em domicilio alheio.
Pois bem.
No que diz respeito ao conceito de domicílio, é fato que referido conceito é mais amplo no direito penal que no direito civil, de forma que o domicilio, para fins penais, é extraído do art. 150, §4º do Código Penal, compreendendo qualquer compartimento habitado; aposento ocupado de habitação coletiva (v.g. quarto de hotel); compartimento não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade (v.g. consultório médico; escritório de advocacia). Diga-se que também compreende, para fins de aplicação do Estatuto do Desarmamento, toda a extensão do território rural.
Já no que diz respeito ao conceito de dia, prevalecia na jurisprudência o critério físico-astronomico, segundo o qual dia seria o período entre a aurora e o crepúsculo. No entanto, a Lei de Abuso de Autoridade especificou como dia, de maneira mais segura, o período compreendido entre 5:00h (cinco horas) até 21:00h (vinte e uma horas).
Por fim, sobre o ingresso em domicilio alheio. Estando em situação de flagrância, é possível entrar na residência, do fugitivo ou de terceiros, em razão do permissivo constitucional. No caso de invasão do domicilio do fugitivo, sendo perseguido na forma do art. 302, inc. III do CPP ou no caso de invasão de domicilio de terceiro (situação na qual o fugitivo estaria cometendo o crime de violação de domicilio) estar-se-ia em situação de flagrância e, por isso, autorizado o ingresso.
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